quinta-feira, 17 de março de 2011

VAI NO BORNÁ

VAI NO BORNÁ
(Clerisvaldo B. Chagas, 17 de março de 2011).

       Bornal, embornal ou, segundo as massas da caatinga, simplesmente borná. Trata-se de uma peça interessante confeccionada em tecido que as pessoas ainda usam com faixa sobre os ombros, cruzando o peito. Os embornais serviam e servem como uma bolsa plástica ou pequena mala para transportarem tudo que for possível durante as viagens. Como em décadas passadas o homem do Sertão andava muito a pé, aquele depósito ambulante estava em voga levando comida, roupas e quinquilharias. Os bornais viraram peças famosas e estudadas, principalmente por causa daqueles que lhes deram visibilidade. Os cangaceiros atraiam a atenção pelo modo singular de traje e enfeites. O embornal era peça tão importante quanto às armas, pois, tanto conduzia a comida de sobrevivência, quanto balas sobressalentes. A polícia perseguidora do cangaço também usava os bornais com as mesmas finalidades. Por aí se vê que o embornal era peça indispensável para uso em trânsito. Com o cangaço, os bornais adquiriram um novo visual. Passaram de peças lisas para estampadas em bordados criativos que atraíam os olhares aguçados dos sertanejos. Os embornais mais famosos do Brasil foram os conduzidos por Lampião e sua companheira Maria Bonita. As peças eram admiradas por causa dos desenhos em cores, cobiçadas devido à fortuna que transportavam. Como Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, também era compositor, fez chegar ao povo cantiga simples, porém, muita apreciada, com o título de “Mulher Rendeira”. Uma das estrofes dizia:

      “Olê mulé rendeira
Olê mulé renda
               Chorou por mim não fica
           Soluçou vai no borná”

       O escritor santanense Oscar Silva, antes de publicar livros, trabalhara em diversas profissões, tentando sobreviver numa época péssima para empregos. Terminou como soldado de polícia pertencente ao batalhão encarregado de combater o cangaço, dentro da era 1930. O batalhão fora dividido, segundo ele, em várias faixas de acordo com as funções. Oscar não pertencia à faixa dos destemidos que saiam em grupos chamados “volantes”, para combates diretos com bandidos. Fazia parte de uma elite que auxiliava o comando em seus contatos permanentes. Andava sempre com livros na mão sublinhando em vermelho os erros cometidos pelos autores. Certa feita participara de uma empreitada contra cangaceiros no lugar chamado Caldeirão dos Guedes, município de Cacimbinhas, Alagoas. Por causa dessa única circunstância forçada, o futuro escritor passara a andar com um bornal sobre os ombros. Dizia o homem em uma das suas crônicas, que o bornal não servia para nada, pois ele nunca mais saíra como volante, mas pelo menos o ocupava para carregar seus livros. Passara a enfeite. Certa ocasião um camarada apontou para aquela peça de tecido e perguntou para que servia. Oscar, sentindo-se acuado e ridículo, olhou para um canto, para outro e, sem utilizar longas explicações, foi lacônico, gozador e objetivo, lembrando a célebre cantiga do cangaço: “Soluçou VAI NO BORNÁ”.




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